28/10/2009 - 13:28

Linguagem nova para museus novos

 
Marcello Dantas, na conferência Arte e convergência das mídias na 13ª Jornada Nacional de Literatura, disse que os novos espaços culturais devem privilegiar a interatividade com o público, usando para isso a linguagem do nosso tempo

Foto: Tiago Lermen/UPF
Dantas participou de conferência no Circo da Cultura
Museus como o Louvre, em Paris, ou o Prado, em Madri, certamente não vão deixar de existir, ao contrário das premonições sobre o futuro do livro. Mas uma coisa é certa: novos museus terão que encontrar uma nova forma de linguagem para dialogar com o público. Interatividade, inclusão, acessibilidade são as palavras-chave dos novos espaços culturais e o modelo tradicional de coleção de obras de arte deve dar lugar às novas tecnologias e novas mídias, privilegiando a linguagem do nosso tempo.

Esse foi o tema da conferência do curador e designer de espaços culturais Marcello Dantas, na segunda noite da 13ª Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo. O Circo da Cultura ficou novamente lotado nesta terça-feira, 27 de outubro, quando, atentos, os participantes ouviram Dantas proferir a sentença: “Considero antiga a discussão sobre se o livro vai acabar ou não. O que importa é que a literatura não vai acabar”, afirmou durante a conferência “Espaços culturais e convergência das mídias”. Os trabalhos da noite foram coordenados pela professora Neusa Maria Henriques Rocha e contaram com a participação dos coordenadores dos debates da Jornada Alcione Araújo, Júlio Diniz e Ignácio de Loyola Brandão.

Dantas iniciou a conferência chamando a atenção de que é preciso pensar o modelo de espaço simbólico para representar a sociedade hoje. “Chamo isso de novas catedrais, porque elas foram através dos tempos os lugares onde a sociedade confluiu com arte, com liturgia, com o dinheiro e o poder. Hoje temos que construir um novo tipo de catedral, que precisa ser diagonal na sociedade, falar com o jovem, o desempregado, o executivo”, destacou. Segundo ele, existem poucos mecanismos que atualmente conseguem falar com a sociedade inteira, sendo os museus um dos últimos territórios onde isso ainda é possível.

O designer e curador de exposições crê numa sociedade em mutação, de esgotamento de um modelo que se evidenciava por meio do material. “Não se consegue mais construir em cima desse modelo, especialmente porque talvez a nossa cultura não seja mais tão fácil de ser representada através de elementos materiais. Nossa cultura é fortemente imaterial e o que importa são as relações entre as coisas, não tanto as coisas em si”, afirmou. De acordo com Dantas, é preciso pensar um local para celebrar a cultura imaterial, não importa o suporte, e isso diz respeito à literatura, à poesia, à música, à dança e demais representações.

Relatando a história do Museu da Língua Portuguesa, do qual foi diretor artístico, Dantas pontuou que a foco era encontrar uma forma atraente de contar uma história que ninguém havia contado: a da língua portuguesa. Ele demonstrou exemplos de outras exposições e museus, que participou da concepção, sempre preocupado com a forma de dispor a informação ao público. “Nos últimos 20 anos, saímos da era da tecnologia analógica para a tecnologia digital, então, não é de se surpreender que algumas mídias sofram estado de obsolescência. Isso não quer dizer que elas deixarão de existir. Significa que pararam de inovar”. Na opinião dele, isso acontece com o rádio, com os museus tradicionais enquanto catedrais de colecionismo, ou com o livro, que tem seu formato tradicional resolvido. “Isso não significa que não vamos pensar em novidades na literatura, por exemplo. O desafio é a linguagem, na maneira de como se criar uma linguagem para se comunicar e interagir com as novas gerações para que elas se apaixonem por aquilo que a gente considera simbolicamente importante para a nossa cultura”, considerou.

Para ele, é preciso haver o que chama de ‘imersão total’, junção de elementos de linguagens que permitam novas formas de criar eixos de afetividade do público com os museus e os espaços culturais. Outro elemento da imersão total, segundo Dantas, é a interdisciplinaridade, o cruzamento dos saberes. “A tecnologia não muda a essência das coisas, ela é suporte sempre transitório, o saber tecnológico tem prazo de validade, muito breve, a gente tem que estar sempre pesquisando e tentando olhar para alguma coisa nova”, disse, justificando que a vida ainda é a única matéria-prima da arte. Ele ressaltou que nunca se inspira na tecnologia para contar qualquer história, se inspira na vida. “Mas é preciso utilizar a linguagem do meu tempo, isso é uma condição”, alertou.

Além da linguagem, Dantas acredita que é importante dar às pessoas inclusão, acessibilidade. “Tenho que entender que o fato de uma grande massa de brasileiros não ser corretamente alfabetizada, não quer dizer que essa massa não tenha inteligência. Quando utilizo a cultura material tenho que provê-la de narrativa, porque isso é o que dá na gente a dimensão da emoção, ou seja, é trazer a história para o objeto e não esperar que o objeto faça isso sozinho”, salientou. Aplaudido pelo público, ele finalizou a palestra dizendo que cabe a quem pensa arte e cultura encontrar alternativas para todos os desafios colocados. “Estou fazendo a minha parte com a tarefa de criar pontes entre conteúdos, vidas, pessoas e a técnica do meu tempo”.

Assessoria de Imprensa Jornadas Literárias