Mia Couto vence o 5º. Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon na Jornada Nacional de Literatura
27/08/2007 - 23:00
Escritor moçambicano ganhou o prêmio de R$ 100 mil pelo melhor romance

O outro pé da sereia, do moçambicano Mia Couto, foi o vencedor do 5º Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura. O anúncio do melhor entre os 215 romances em língua portuguesa publicados nos últimos dois anos e inscritos nesta edição do prêmio foi feito na abertura da 12ª Jornada Nacional de Literatura, na noite desta segunda-feira, dia 27. Além do prêmio de R$ 100 mil, ele ganhou o Troféu Vasco Prado concedido pela Universidade de Passo Fundo. A Jornada Nacional de Literatura é uma realização da UPF e da Prefeitura Municipal de Passo Fundo, com patrocínio cultural da Petrobras, Banrisul, Caixa RS, Eletrobrás, RGE, Coca Cola, Fonte Ijuí e Grazziotin.

Os vencedores do 10º concurso Nacional de Contos Josué Guimarães também foram revelados: em primeiro lugar ficou Lúcia Bettencourt, que ganhou o prêmio de R$ 5 mil e uma viagem para Santiago de Compostela, na Espanha, e em segundo lugar, com o prêmio de R$ 3 mil, ficou Bruno Dorigatti. Foram concedidas menções honrosas para Marcus Vinicius Teixeira Quiroga Pereira, Francisco Carlos Lopes, Katja Plotz Fróis, Silvio Luiz Rocha, Jorge Júlio Schwartz Rein e Luci Collin.

Mia Couto, que veio da África especialmente para Passo Fundo, lembrou que estava na Jornada quando o Prêmio Zaffari & Bourbon foi criado. “Estar aqui dez anos depois é uma enorme alegria”, disse. “Mas mantenho esse sentimento de estranheza. Acredito que o Brasil já me deu mais do que eu mereceria receber. As minhas influências, os meus grandes mestres vêm desta terra”. Ele citou Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector, Manuel de Barros, Adélia Prado. “Todos esses escritores me instigaram a imprimir na língua portuguesa, que é a língua de Moçambique, a marca de uma outra cultura. No meu caso, a cultura africana”.

“Hoje eu é que deveria trazer um prêmio de Moçambique e entregar aos brasileiros. A questão, meus amigos, seria: a quem? Agora eu não tenho dúvida nenhuma. Eu entregaria esse reconhecimento às Jornadas de Literatura de Passo Fundo”, disse. Ele lembrou que pelas jornadas já passaram vários escritores africanos que encontraram, neste espaço, “um espaço perfeito para a divulgação de suas obras”.

Mia Couto é um dos mais destacados nomes da literatura africana de expressão portuguesa. Já escreveu 19 livros e suas obras foram traduzidas e publicadas em 21 línguas. É, também, um dos escritores estrangeiros mais vendidos em Portugal (com mais de 400 mil exemplares). Ele disputou o 5º Prêmio Zaffari & Bourbon com o nobel José Saramago (As intermitências da morte) e com renomados escritores brasileiros como Milton Hatoum (Cinzas do Norte), Luiz Ruffato (Vista parcial da noite), Flávio Carneiro (A confissão), Daniel Galera (Mãos de cavalo), Helder Macedo (Sem nome), Ana Maria Gonçalves (Um defeito de cor), Maria Valéria Rezende (O vôo da guará vermelha), Antônio Torres (Pelo fundo da agulha) e Adriana Lunardi (Corpo estranho).

Lançado simultaneamente no Brasil e em Portugal, O outro pé da sereia faz um retrato poético, alegórico e também crítico da Moçambique contemporânea. A imagem de uma santa católica que encanta e perturba todos os que dela se aproximam é o centro de uma trama dividida em dois momentos históricos, ligados por questões étnicas, religiosas e de destino familiar.


MIA COUTO
António Emílio Leite Couto, mais conhecido pelo nome literário de Mia Couto, nasceu na cidade da Beira, Moçambique, em 1955, filho de pais portugueses. Participou da luta pela independência de Moçambique, mas afastou-se da militância política depois da libertação do país, em 1975, e se tornou jornalista. Dirigiu a Agência de Informação de Moçambique, a revista “Tempo” e o “Jornal de Notícias”. Estreou com um livro de poesia, Raiz de orvalho, publicado em 1983, seguido de Vozes anoitecidas, de 1986, uma coletânea de contos. Mas seu gênero predileto é o romance, que cultiva desde 1992, quando publicou o premiado Terra sonâmbula.

O universo moçambicano, marcado pela guerra, mas também pela construção do país, pela busca da identidade étnica, lingüística e cultural do povo, está no centro das narrativas de Mia Couto. Uma das características de sua prosa é a recriação literária dos falares populares, traço comum a Guimarães Rosa, de quem o escritor reconhece a influência. Trabalhar com a oralidade significa recuperar a dignidade das línguas tradicionais que se combinaram com o português herdado do colonizador.

No Brasil, publicou os romances Terra sonâmbula, pela Editora Nova Fronteira; A varanda do frangipani; O último vôo do flamingo; Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra e O outro pé da sereia – todos pela Companhia das Letras, além dos livros de contos Cada homem é uma raça e Estórias abensonhadas, ambos pela Nova Fronteira.

Paralelamente à atividade de escritor, Mia Couto é biólogo especializado em ecologia. Além de pesquisas na área, dedicadas à gestão de zonas costeiras, é professor universitário e consultor ambiental.

Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura
Com dotação de R$ 100 mil, o Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura é um dos mais concorridos do país e premia o autor do melhor romance escrito em língua portuguesa, que tenha sido publicado no período entre as Jornadas de Passo Fundo, que acontecem a cada dois anos.

O primeiro prêmio, na 8a Jornada (1999) ficou para Sinval Medina, gaúcho radicado em São Paulo, autor do romance “Tratado da altura das estrelas”. Depois, na 9a Jornada (2001), dividiram o prêmio o catarinense Salim Miguel e o baiano Antônio Torres, com os romances “Nur na Escuridão” e “Meu Querido Canibal”.

O romance “O Riso da Agonia”, do gaúcho Plínio Cabral, levou o 3º Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura na 10a Jornada, em 2003. Na 11a Jornada (2005), “Budapeste”, de Chico Buarque, conquistou o prêmio de R$ 100 mil. Chico fez questão de ir à Passo Fundo receber o prêmio.
Concurso Nacional de Contos Josué Guimarães
Criado em 1988, o Concurso Nacional de Contos Josué Guimarães homenageia o jornalista e escritor gaúcho que estimulou a criação e expansão das Jornadas Literárias de Passo Fundo. O prêmio dá ao primeiro colocado R$ 5 mil, o Troféu Vasco Prado e uma viagem de dez dias a Santiago de Compostela, na Espanha, com passagem (saída de São Paulo) e hospedagem gratuitas. O segundo colocado ganha R$ 3 mil. Nesta edição, foram inscritos 3.375 contos de 1.125 autores de 25 estados do Brasil e até do exterior, de países como Portugal, Itália, Argentina e Alemanha. Os contos premiados serão editados em antologia organizada pelo Instituto Estadual do Livro, a ser publicada em co-edição com a Fundação Universidade de Passo Fundo e com a Prefeitura Municipal de Passo Fundo.